quarta-feira, 6 de maio de 2009

Entendendo a Municipalização do Ensino

João Zafalão*


Em 1996, de forma absolutamente autoritária, foi aprovada, na calada da noite, no dia 20 de dezembro a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei 9394/06). Apesar de não contemplar as reivindicações do movimento e da sociedade, pois mantém a lógica mercantil ao autorizar o ensino privado e não vetar verba pública pra essa modalidade de ensino, estamos diante de uma situação ainda mais grave, pois sequer o que está escrito na LDB está sendo seguido pelos governantes.

A expressão mais grave disso se assiste na política de municipalização do Ensino Infantil (ciclo I) e total abandono das creches e pré-escola (crianças de 0 a 6 anos).

Vejamos o que diz a LDB:

Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996.
Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA
Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
TÍTULO I

TÍTULO III
Do Direito à Educação e do Dever de Educar
Art. 4º. O dever do Estado com a educação escolar pública será efetivado mediante a
garantia de:
I - ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram
acesso na idade própria;
II - progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao ensino médio;
III - atendimento educacional especializado gratuito aos educandos com necessidades
especiais, preferencialmente na rede regular de ensino;
IV - atendimento gratuito em creches e pré-escolas às crianças de zero a seis anos de
idade;
V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística,
segundo a capacidade de cada um;
VI - oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do educando;
VII - oferta de educação escolar regular para jovens e adultos, com características e
modalidades adequadas às suas necessidades e disponibilidades, garantindo-se aos que
forem trabalhadores as condições de acesso e permanência na escola;


No Inciso I, do artigo 4º podê-se observar que a LDB defende que o obrigatório é o Ensino Fundamental (1º até 8º série). Também especifica que após atendimento de 100% dessa modalidade deve iniciar a universalização do Ensino Médio (Inciso II) e “atendimento gratuito em creches e pré-escolas às crianças de zero a seis anos de idade” (Inciso IV).


Art. 5º. O acesso ao ensino fundamental é direito público subjetivo, podendo qualquer
cidadão, grupo de cidadãos, associação comunitária, organização sindical, entidade de
classe ou outra legalmente constituída, e, ainda, o Ministério Público, acionar o Poder
Público para exigi-lo.

§ 4º. Comprovada a negligência da autoridade competente para garantir o oferecimento
do ensino obrigatório, poderá ela ser imputada por crime de responsabilidade

No Parágrafo 4º do artigo 5º, determina que seja imputado “crime de responsabilidade” ao poder público (Estado e Prefeituras) caso não realizem o atendimento obrigatório.

TÍTULO IV
Da Organização da Educação Nacional
Art. 8º. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão, em
regime de colaboração, os respectivos sistemas de ensino.
§ 1º. Caberá à União a coordenação da política nacional de educação, articulando os
diferentes níveis e sistemas e exercendo função normativa, redistributiva e supletiva em
relação às demais instâncias educacionais.

Art. 10º. Os Estados incumbir-se-ão de:
I - organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições oficiais dos seus sistemas
de ensino;
II - definir, com os Municípios, formas de colaboração na oferta do ensino
fundamental, as quais devem assegurar a distribuição proporcional das responsabilidades,
de acordo com a população a ser atendida e os recursos financeiros disponíveis em cada
uma dessas esferas do Poder Público;

Art. 11º. Os Municípios incumbir-se-ão de:
I - organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições oficiais dos seus sistemas
de ensino, integrando-os às políticas e planos educacionais da União e dos Estados;
II - exercer ação redistributiva em relação às suas escolas;
III - baixar normas complementares para o seu sistema de ensino;
IV - autorizar, credenciar e supervisionar os estabelecimentos do seu sistema de
ensino;
V - oferecer a educação infantil em creches e pré-escolas, e, com prioridade, o ensino
fundamental, permitida a atuação em outros níveis de ensino somente quando estiverem
atendidas plenamente as necessidades de sua área de competência e com recursos acima
dos percentuais mínimos vinculados pela Constituição Federal à manutenção e
desenvolvimento do ensino.
Parágrafo único. Os Municípios poderão optar, ainda, por se integrar ao sistema
estadual de ensino ou compor com ele um sistema único de educação básica

Nos artigo 8º, 10º e 11º se estabelece a organização da Educação Nacional, regulamentando a obrigação de cada ente da federação. No artigo 11º inciso V, se estabelece que os Municípios incumbir-se-ão de “oferecer a educação infantil em creches e pré-escolas...”

Pela LDB depois de realizado 100% do atendimento às crianças de 1º a 8º séries (ensino fundamental ciclo I e II) às prefeituras cabe a obrigação de atender o ensino infantil de 0 a 6 anos.

Para aplicar essa política de “atendimento” ao Ensino Fundamental o governo criou o FUNDEF (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério), que foi instituído pela Emenda Constitucional n.º 14, de setembro de 1996 e regulamentado pela Lei n.º 9.424 de 24 de dezembro do mesmo ano e pelo Decreto nº 2.264, de junho de 1997. O FUNDEF foi implantado nacionalmente em 1º de janeiro de 1998 quando passou a vigorar a nova sistemática de redistribuição dos recursos destinados ao Ensino Fundamental, quando os convênios de municipalização proliferaram. A conseqüência foi a demissão de milhares de professores e total abandono do ensino infantil. O FUNBEB (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Básico e Valorização do Magistério) é a versão de municipalização do governo Lula.

O que ocorre é que as prefeituras interessadas em receber as verbas do FUNDEB, estão municipalizando as escolas de ensino fundamental do ciclo I (1º a 4º séries). Acontece que no Estado de São Paulo, todos os índices demonstram que já existe uma universalização dessa modalidade, portanto o estado está encaminhando aos municípios alunos que já estão estudando. A conseqüência disso é o abandono das crianças de 0 a 6 anos que não tem creches e EMEI´s.
A Municipalização do Ensino é um retrocesso, pois as escolas municipais não têm melhores índices educacionais como querem nos fazer crer, e acarreta o abandono do Ensino Infantil em todos os municípios e ainda conta com o apoio do governo federal de Lula, que garante repasse maior por aluno matriculado no Ensino Fundamental do que os matriculados no Ensino Infantil, através do FUNDEB, conta com o apoio dos governos estaduais, que querem enxugar sua rede de ensino, como se educação fosse uma mercadoria e a escola uma empresa e as prefeituras que querem o dinheiro do FUNDEB e tomam suas decisões de municipalizar a partir de cálculos financeiros e não com preocupação social, pois atender o Ensino Infantil é mais caro.

Vejamos o Caso de São José dos Campos .

Segundo o IBGE a população estimada de São José dos Campos em 2008 era de 609.229 habitantes. Destes cerca de 60 mil tem entre 0 e 6 anos de idade. Segundo o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, o Censo Escolar 2008 (Educacenso) informa que em São José dos Campos o atendimento escolar ao Ensino Fundamental é o seguinte:

Dependência
Creches Estadual - 8 alunos creche municipal - 4.005 alunos creche privada - 4.331 alunos
Pré-escola Estadual - 5 alunos pré-escola municipal - 12.976 alunos pré-escola privada - 4.733 alunos

Total: creches - 8.341 vagas no município
pré-escola - 17.714 vagas no município

Em São José dos Campos existe 26.055 crianças de zero a seis anos atendidas em creches e pré-escolas municipais e privadas.

Considerando a população nesta faixa de idade em cerca de 60 mil no município, existe um déficit de pelo menos 34 mil vagas.

Segundo informação da Prefeitura de São José dos Campos, no município “o percentual de crianças entre 7 a 14 anos fora da escola é de 0%.”

Conclusão:
Em São José dos Campos, as crianças de 7 a 14 anos estão todas matriculadas em escolas estaduais, municipais ou privadas. Por outro lado, temos ao menos 34 mil crianças de 0 a 6 anos sem atendimento de creches e pré-escolas.

Qualquer pessoa que tenha compromisso com a educação conclui que a prefeitura deve cumprir sua obrigação, segundo a LDB (art 11º inciso V) de atender a demanda do ensino infantil. Portanto, a prefeitura deve criar vaga para as 39 mil crianças que estão sem atendimento, e só a partir daí poderá debater a municipalização de escolas estaduais.
Se fosse pouco, a municipalização também provoca demissão entre os professores, que há anos se dedicam ao ofício do magistério. Em uma cidade, onde os trabalhadores são penalizados pela crise, como no absurdo caso das demissões na EMBRAER, a prefeitura de São José, dará sua contribuição, demitindo professores.

Contra a Municipalização do Ensino. Defendemos a construção de creches e EMEI´s para atender o ensino infantil.

* João Zafalão é Secretário de Política Sindical da APEOESP
Oposição Alternativa/CONLUTAS

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